sexta-feira, 30 de abril de 2010

Adeus à Espanha

Meus olhos redondos param por um instante. Escuto, espero. Preso no escuro, apenas espero. Busco em minhas costas um espinho venenoso, com veneno amargo que sinto com a pele, e sinto que este espinho bate dentro de mim. Não vivo mais. Meus olhos param por um instante, sem encontrar os teus eles se fecham, e não há mais nada que eu possa reparar, não há sacrifício que eu possa repassar. Agora sou eu, agora é a mim o que me resta. Santo e sereno, mais do que gostaria. Ameno e inofensivo, perante a cólera de deus, sabendo que o fogo arde por todas as partes, fogo amigo que não fere menos do que todos que já me queimaram apenas uma vez ou uma dúzia. Mando cartas aos músicos, aos missionários, lanternas aos afogados, faróis, pequenos sóis, ilumino a treva alheia e pereço na minha. Sopro as minhas velas na câmara final, acendo as luzes da câmara escura e queimo todas as memórias que ficaram. E Hermes que não me entenda mal, e que me perdoe, mas como suplica final, peço que corra por mim o globo, que acorde os deuses, que apague as velas que velam os seminecros, puxe as cortinas dos olhos do mundo, e cante assim minha canção, vermelha sempre vermelha, tal qual as saias das espanholas que me trazem pesar por partir, que sempre me fizeram sonhar, que me dão vontade de rir...

terça-feira, 27 de abril de 2010

Requiem for Thanatos


Memento Mori


Desci o máximo possível para qualquer mortal e um pouco mais alem, cruzei as portas da vida, e abandonei toda a fé e esperança. Abandonei meus sentidos, me desfiz por completo, e antes imerso no medo liquido que me circundava, passei a fazer parte dele. Senti os timbres graves e agudos, os cantos de toda a humanidade passada, todos os gritos de guerra e choros de mães, e aos poucos comecei a compreender tudo, vi a linha da vida se tecer em minha frente, vi seu começo, seu fim, sua matéria prima, e seu criador. Passei a me dissipar por este universo verdadeiro e a fazer parte de tudo, e ao fazer parte, compreendia. Não seria possível beleza maior, não haveria até então e nem para alem do fim dos tempos qualquer forma de descrever a beleza Pura que gotejava no oceano da Verdade. Que mesmo Deus seria incapaz de reproduzir ou descrever. À essa altura não tinha mais ambições de voltar, já sabia então todos os mistérios dessa vida e de muitas outras, e nada mais me prendia, evolui minhas vontades e instintos para o da própria essência imaterial da grande Verdade que existia. Seguia o fluxo do saber etéreo, sabia seu fim, sabia tudo, e sabia que não havia necessidade de julgamento, não era então mais preciso saber se eu gostava disso ou não, já que inicialmente nem “eu” havia mais. Eu havia crescido, evoluído, agora já nem tangível minha essência era mais, e nenhum sentimento me permeava. Não imagino coisas como dantes faria, não cogito a dolorosa pena e pesar para com o resto da existência, nem as possibilidades de outros terem feito como eu, ou se há de fato algo mais a se saber. Se fosse parte de mim antes, acharia graça, mas não há mais isso, nem necessidade nem vontade. Sei de tudo isso, e mesmo que me engane, não importa, agora já não escrevo como um ser, referencia diferencial perdida em palavras, seria assim minha existência agora. Mas certamente compreendo que a existência é uma limitação que a muito ficou para trás. Agora fecho os olhos e cortinas da infinitude e passo a simplesmente a não ser, como agora sempre fui.

domingo, 18 de abril de 2010

Flames


Abro meus olhos com um sorriso no rosto, e decido que essa noite será boa, excepcionalmente boa. Diferente de tudo que tem sido e que acreditam que será. Vou acender a noite com fogo, vou dançar chamas, sorrir o tempo todo e rir sempre que possível, e acreditar que pode ter mais no mundo do que eu preciso, celebrar a isso. Pois eu posso! Eu sei que posso. Vou gritar com a voz rouca palavras de amor e grandeza, vou transcender a mim ao fazer corações brilharem, vou me propagar alem da existência, e vou ficar feliz pela beleza do apagar da minha chama mais do que triste pelo seu fim, vou ser fênix e cinzas da humanidade, vou inflamar espíritos incitar lutas pacificas e guerras indolores por coisas melhores e maiores, por causas belas e pela evolução, vou criar vitorias e inspirar verdades. Farei essa noite durar semanas e valer por séculos, serei eterno só hoje e vou cantar canções com o mundo, e vamos marchar adiante, deixaremos um rastro de fogo gentil chamado vida e andaremos como um, com passos de gigante para além da lua sem medo de onde pisar, sem medo de falhar. Hoje e somente hoje a noite será dia, e apertaremos os olhos, sem medo de fechá-los, respiraremos esse novo ar, e assoviaremos marchas de esperança banhados em temperança e amando sempre. Hoje e só hoje não terei pesar em dizer adeus, e irei brilhar como a estrela guia, e me sentirei feliz por ir com tanta graça, por secar as lagrimas de uma humanidade flagelada que se cura com o calor irradiado pela minha reação em cadeia. Hoje e somente hoje dormirei meu ultimo sono aconchegado e sonhando feliz com tudo aquilo que passou, com tudo aquilo que fui e que sou, e o incêndio implacável da vida que me tome por matéria prima e me faça feliz por ser útil a tudo que é maior que eu.